Sejam bem vindos!!

























sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Só agora

O tempo é como um poema.
Um poema que se termina de repente.

O poema  nasce na desventura da rima.
A rima se faz com o tempo.

O tempo exige  paciência e rapidez.

O tempo precisa...

De ouvidos atentos
De olhos dispostos
De sentidos ligeiros

O tempo e o poema.

Ambos precisam de tempo para que o tempo 
cuide dos sentimentos
Que surgem com o tempo.

O tempo é espelho que não se enxerga totalmente.
O tempo não espera pelo reflexo.
O tempo olha simplesmente.

E nisso o poema corre risco.
Ele precisa de demoras, precisa de tempo.

O tempo curto precisa de tempo para distâncias longas,
Precisa de um pouco de solidão para caminhar 
E quem sabe chegar.

O tempo carece de horas jogadas ao vento.
Ou mesmo de tempo sereno.

O tempo está em todo momento.
E se faz é agora.




terça-feira, 19 de novembro de 2013

♥ Meu amor


O que foi acaso
 converteu-se em prazer 
As conversas sem maiores implicações 
agora são tardes de emoção.

O que os olhos já gritavam, 
       Os sorrisos teimavam em disfarçar 
nas sombras do desapego.
Nosso amor, já era tudo antes de ser.
Os encontros já tinham um sabor adocicado.

O amor já se mostrava.

Dizer do amor que se escancara 
é como falar do sol que anima lá fora
Da lua que reluz pelas lacunas da casa
Amor é tudo que não sei dizer agora
É o que a boca cala para dar parte às palavras

Amor é aquela lágrima...
Amor é aquele sorriso ao ser beijada...
Amor são àquelas horas de risadas...
Para ser amor nada mais necessita, 
além de tudo que jaz pousado
em nossas asas

Já era amor dentro de mim e de você

Amor foi o que me destes sem eu merecer.
Amor é olhar para você
É a poesia do seu dizer.
Amar é não saber por quê.

Amor não se traduz, 
nem aqui nem em folha qualquer.
Isto não posso, definir meu amor 
seria enquadrá-lo, e ele só deseja ser.

Tua paz é o que me move
Tua voz toda noite me conforta
Teu ombro me aconchega 
como uma mãe pássaro protege sua prole.
É em teus braços grandes que me desfaço, 
me faço e refaço.
É no brilho do seu amor 
que vejo as estrelas no ar.

Amar você é ter tudo e nada carecer
É a felicidade como todos gostariam de ter
É não ter reservas
É gastar tudo de uma vez
Sabendo muito ainda ter.

Eu te amo com calma e euforia

Te amo como quem dança à falta de música
Te amo com sinceridade infantil
Te amo com a alma toda
Te amo com o corpo pleno
Te amarei a vida inteira.




terça-feira, 1 de outubro de 2013

Nada leve


O que posso sentir, senão o que de dentro me confronta, me enfrenta, me espanta?
O que posso tocar senão os meus anseios e desejos, às vezes tão mesquinhos, tão infames?
O que não suporto, o que me retorna de fora e de dentro, dos lados e me devora.
 A vida sempre devolve da mesma forma.
Quem pode deixar de ser o que foi de antemão considerado?
Ninguém pode escapar da vida e até mesmo a morte não pode nos roubar a hora da partida.
O que de você me é apresentado, o que de mim não tenho como único, o que de tantos me disfarço?
Tenho de mim, de você e de outros que nunca olhei.
O que minhas verdades dizem é a mentira da humanidade.
O que sei é o que todos sabem.
A subjetividade é uma máscara que se usa para não enlouquecer, para não esquecer
a poesia do mundo.
É o choro, é o desespero, sou eu sozinha assim, dentro do quarto.
Meu olhar é mudo, meu olho escuta, meu ouvido fala.
Tudo fala por mim, tudo se move, tudo cala em mim.
Olhe suas mãos, sinta seu coração.
Veja como pulsa, arde...

É a vida e ao mesmo tempo a morte.





segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Outono dos dias


Tenho medo do cansaço...

De faltar a vontade, faltar a alma, faltar a calma.
De  andar somente por andar.
 De o sorriso me deixar, da alegria se dissipar.
De querer menos, do fim e de acabar.
De não enxergar, da invisibilidade,
De naturalizar os encontros.
Medo de não me achar.

Tenho medo do cansaço...

De não saber ouvir, das vozes que porventura posso ignorar.
De não perceber, de não saber, de não poder me expressar.
Da rotina, dos dias que vão saindo de cena
e voltando com o mesmo ar.
 Medo dos desentendidos, dos ditos e não ditos.

Tenho medo do cansaço...

Do desamparo, do sono que as noites me roubam.
Da desistência, da vida acabar.
De esquecer os sonhos, de deixar pra lá.
Medo que o medo me tome, da tristeza chegar.
Da omissão, do olhar e passar.

Tenho medo do cansaço...

Do ócio injustificado.
Da falta de iniciativa
Medo dos porquês de todo dia.
Tenho medo do tempo, ligeiro que passa.
Receio os obstáculos miúdos e as explicações vazias.

Tenho medo do cansaço dos dias...


sábado, 24 de agosto de 2013

Meu viver!


Fechei janelas importantes, eram cheias de grades que me prendiam, grades invisíveis, idéias arraigadas a mim, e eu não percebia assim. Mas não as cerrei por definitivo, elas continuam esperando por mim, não abandonei meus intentos passados, meu velho assoalho. Tudo que construí acima dele, ele, por vezes, me recorda o que antes me atrelava ao chão. Um ser, um lugar, uma ideia, um amor de rei. Dias ensolarados, dias convencionais, dias repletos de conformismo, de injúria, de querer ficar, de sair sem rumo, de olhar nos olhos, de fugir de lá. Um dia eu olhei para trás, eu toquei o chão, eu quis parar, não pude voltar. Uma página saiu voando, com uma ventania que jamais passará. Um dia, faz tempo e o tempo se faz agora. Houve um tempo que o dia era futuro e o futuro agora. Houve em mim jardins com olhos humanos, em cada olho um lugar e um ideal de ego que eu não podia explicar.  Andava e meus pés queriam voltar, havia pouca paz e muita melancolia. Ainda não sei em qual janela permanecer, qual a melhor paisagem. Não sei dizer se o céu que hoje contemplo é mesmo o reflexo do dia que não passa, do dia que nunca passará. Existe um tempo eterno? Um momento que pode durar? Eu vivo como quem não sabe olhar, eu vivo com meus limites, com tudo que sou agora, eu vivo como quem luta e não sabe contra quem lutar. Eu sigo em frente e não quero mais voltar, eu continuo num caminho que parece o melhor, eu deixei outra vida antes e preciso, pelo menos, saber o que deixei para lá. Me pergunto quem sou eu, quantos não já perguntaram? Eu sigo perguntando quantos passos valem a pena, quantos caminhos caminhar, eu pergunto todo dia que é essa psicologia? Eu pergunto quem vai me explicar. Quantos olhos encontrei! Olhos mesquinhos, olhos de burguês. Encontrei olhos vazios também olhos de amor e prazer, olhos de piedade, encontrei você. Falei para ouvidos atentos, falei como quem canta uma música indecifrável, falei e falei. Ouvi histórias tristes, ouvi piadas que me fizeram rir, ouvi sem querer, ouvi sentindo uma dor que nunca havia sentido, era amargura, aflição, agonia. Tive que ouvir, tive que segurar o choro, a voz, tive que sair ereta, tive que permanecer. Quantas casas entrei, quantos dias me escondi de mim, só pra me defender. É duro olhar e sentir que a vida é tão mesquinha assim, mas a vida me alegra quando sabe agradecer, quando devolve a alegria, quando a esperança é madrinha, quando  se busca um refúgio em olhos que brilham, em mãos que se mexem, em sorrisos que me apetecem. Descobri que as janelas alheias são cheias de medo, de desespero. O que me acalenta é sentir o cheiro das rosas por algumas janelas que vejo. Passantes felizes, outros que andam só por andar. Eu estou aqui, é difícil enxergar, é difícil escutar, é difícil falar na hora...(?). Se as pessoas erram, não é porque elas querem errar, quase sempre, não sabemos enxergar, escutar e falar na hora certa.

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Metalinguagem ...






Adoro dizer o que sinto e usar a razão.
Um amor razoável que se esconde da emoção. 
Falamos abertamente da beleza de nos caber. 
É como correr ao encontro de nós dois, sabendo sempre nos ter. 
Se digo sobre a beleza da lua automaticamente estou falando de você. 
Se falo das estrelas é porque me lembram você. 
Se, por acaso, falo do fim, só quero que  perdure para mim.
 As palavras que saem daqui estão querendo
encontrar o princípio e nunca seu fim.
É apenas o medo de pertencer e depois somente perder.
 Nosso amor é consciência e sensatez, 
é como voar sem ao menos sair do chão, 
ter o brilho nos olhos e o coração na mão. 
Uma busca incessante por cada amanhecer.
O sol nascendo para mim, é somente ter você.
 Se por acaso, não vemos um ao outro, só tua voz me acalenta
E a palavra cura a dor da tua ausência. 
Ainda assim, não deixo de clamar teu nome
De ter medo do escuro. 
De morrer aos pouquinhos, 
não sabendo te esquecer.
 Por isso, usamos este artifício, 
lembramos sempre por que um escolheu o outro, 
nosso motivo para viver.













quinta-feira, 25 de julho de 2013

O que não se vê



Olhava para tudo ao meu redor, era uma tarde comum e aconchegante. O céu tinha uma cor alaranjada e as nuvens davam passagem para o colorido se espalhar no horizonte. Eu olhava desatenta para o céu e via nuvens que dançavam junto com a brisa que passava tão calma e melancólica. Minha vontade era de não passar, de ficar ali sentada como quem tem a vida toda para viver. É tão bom ficar quietinha somente olhando, sem deveras ver!
Estava, simplesmente, sentada em um banco de praça entre muitas que existiam no mundo. Apesar desse sentimento de pertencimento cósmico eu sabia que possuía em mim algo intransponível, mas não sabia ao certo, o quê.
Via crianças brincando de se esconder, mães conversando sobre afazeres cotidianos e sobre seus filhos, bicicletas e velocípedes percorrendo a praça bem diante dos meus pés, criaturinhas tão pequenas passavam perto de mim e nem me notavam. Tinha a sensação de estar observando tudo e  no entanto, não estar ser vista por ninguém.
         Ao longe notei que uma criancinha não estava brincando como as outras. Ela tinha na face uma lágrima que parecia não parar de cair, uma lágrima constante. E nos olhos um brilho que não se podia explicar. Parecia uma criança de seus 8 anos, não tenho certeza, cabelos soltos  no compasso do vento, balançava as pernas curtas devagar e em um certo ritmo, como quem se concentrava  para isso. Ela não brincava, não tinha amigos. Parecia triste e ao mesmo tempo não aparentava incômodo por assim estar. Esperei algum tempo na certeza de que alguém se aproximaria dela. Depois de um tempo uma mulher, provavelmente sua mãe pegou sem delicadeza o seu braço, entre xingamentos e gritaria e a levou embora. Fiquei por alguns minutos refletindo na incapacidade humana. Nas mãos atadas, na insuficiência que nos circunda.   
         Quando ainda estava fazendo cogitações sobre a cena anterior, alguém sentou ao meu lado no banco, quase não senti porque o gesto foi simples e brando, assentou como quem não precisa de muito espaço para viver. Olhei para o lado e me senti tão bem. Toda a ideia antecedente se dissipou. Olhos pequenos, cabelos brancos, corpo esguio e um sorriso constante. O pouco tempo que ficou lá sentado, me serviu para vida toda. Eu poderia dizer que ele conversou copiosamente e me ensinou várias lições. Mas não foi isso que aconteceu. Ele só sentou ao meu lado, tem gente que não precisa de palavra para dar um exemplo. Ele distribuía rosas a todos que passavam e, às vezes, como num súbito despertar de sua satisfação ele dirigia-se a mim dizendo que ofertar rosas era seu ofício de viver. Entendi sua satisfação pelo sorriso de quem recebia o presente. Em um momento ele apontou para o céu e pediu que lhe contasse o que eu via. Não entendi, mas comecei a descrever o crepúsculo que surgia tão magnífico. Percebi ao olhar fixo em seus olhos que ele era cego. Mas foi os meus olhos que ele acendeu.
         Os gestos tão distintos dos personagens, mostram o que podemos ser na vida de alguém, o quanto o amor dos pequenos modos podem ser reveladores. Uma tarde na praça, um pôr-do-sol infinito na alma.
        


terça-feira, 21 de maio de 2013

À luz da psicologia


Resenha do filme: Como uma estrela na terra



O filme em todo seu movimento caminha pela disparidade, pelo contraste entre o egocentrismo e o altruísmo, entre os que não acreditam que o amor pode salvar uma história e um professor de artes, que não tem medo de mostrar que a felicidade é passaporte para o sucesso sim, a depender da visão que temos de vencedores.
O diferente é personagem principal da trama, não falo do garoto Ishaan que não conseguia ler e escrever aos 9 anos, não falo do seu colega de classe que não conseguia andar direito, nem tampouco das crianças com alguma deficiência que eram ensinadas em uma escola especial.  Refiro-me ao professor Ram Shankar,  o qual,  sai da sua zona de conforto e olha sem pressa para o menino, que vê além do que é mostrado, não se contenta com a margem e busca mares mais profundos. Presta a atenção no não-dito, no que é apenas olhar que clama por ajuda, sem que a boca nada consiga dizer. Escuta somente pelo prazer de aliviar a dor do outro, e por mais que esse outro não fale tem a sensibilidade para enxergar o avesso.
Há uma diferença entre deixar alguém ser e aprisionar uma alma. O que os pais de Ishaan não entendiam era que ele queria voar, os muitos pássaros que ele admirava, ao percorrer as ruas, mostravam ao garoto que o céu podia ser alcançado. Mas como, se ele estava preso pelas próprias inaptidões? Ele falava pouco, mal dizia se queria bolo ou torrada no café da manhã, também não conseguia dizer o que o incapacitava. Seu pai não o compreendia, sua mãe o aceitava com alguma compaixão e por vezes, tentou ensinar-lhe o que de nenhuma forma aprendeu. Cometia os mesmos erros e isso parecia uma afronta. Quem nunca se deparou com alguém que por mais que tentássemos ajudar ele sempre voltava e pedia perdão pelo mesmo erro? Que tipo de revolta nos causa então, quando esse alguém nem sabe pedir desculpas pelo que cometeu, se é que se vê como inconveniente?
Para os pais do garoto seus erros eram inadmissíveis, sua imaginação ignorada e sua criatividade deixada de lado, tudo isso em prol de um futuro promissor. Ou vai me dizer que para competir nesse mundo de gente perfeita também não temos que ser completos em tudo? Como o irmão mais velho de Ishaan, que era o exemplo de aluno disciplinado.
Se nos cômodos aconchegantes de seu lar ele não podia esperar que seu silêncio fosse compreendido, que dirá nos muros da escola que para ele eram mais que uma prisão?! Ali as palavras eram pré-requisitos para permanecer e o que não fosse leitura e escrita impecáveis, era jogado no lixo da ignorância.
 Os freqüentes castigos nos corredores da instituição, que prometeu dar-lhe a disciplina almejada por todos, mostravam a deficiência do modelo de  “ensino bancário”, termo usado por Paulo Freire para designar o padrão de educação que tenta a qualquer custo transferir para o aluno todo o conhecimento do professor, de forma totalmente linear e autoritária. Tudo que a escola aspirava de seus alunos era o que Ishaan não podia condescender: aluno que se adéqüe aos moldes sociais, robôs em miniatura, crianças aprisionadas pela regra e pelo conformismo. Palmatória na mão e nos olhos o medo de errar. Suas dificuldades de aprender não podiam ter outra causa senão sua desobediência e seu desconforto pelas cadeiras da sala de aula. Repetiu a 3ª série e foi negada sua continuação na escola, foi de certo modo, expulso de sua própria casa.
Qualquer observador atento veria em seus olhos o brilho que expressava ao caminhar pelas ruas da cidade, tão conturbada. O aprendizado que ele, muito mais que na escola, conseguia assimilar. Em tudo ele via algo que o encantava. Tinha feições de gente que não naturalizava a visão das coisas. A sua alegria assemelhava-se ao regozijo de um bebê, se percebesse, à hora do parto, seu nascimento, tudo lhe era novo e peculiar.
Somente depois de desistir de aprender, de abdicar até mesmo do que  lhe era mais caro: desenhar e pintar, é que pôde renascer como fênix, das cinzas da sua suposta incapacidade de ser “normal”. Após constatar que não nascera para as letras e que por mais que tentasse, não conseguiria ser um aluno aplicado (aos moldes da autoritária escola), é que pôde ser olhado de um jeito novo. Alguém prestou a atenção na sua melancolia. O educador Ram Shankar, trouxe arte para uma vida que estava imersa no preto e branco.
Lembro do que pensei quando vi a cena de Ram vestido de palhaço, dançando na sala de aula, da vivacidade que vi nos olhos dos alunos, pensei que só poderia ser um sonho. Não era. E isso foi constatado, quando passada a música que os embalava e a dança que me envolvia, o professor solicitou que os alunos desenhassem o que lhes surgisse na mente. Na mesa de Ishaan o vazio que há tantos anos estava presente nos seus dias.       
“Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”, foi assim para Ishaan, somente depois de saber a causa de sua inadaptação à leitura e escrita  é que pôde se emancipar das amarras invisíveis que o impediam de voar alto. Ir ao encontro do outro quando ele está incapacitado de ajudar-se sozinho, até mesmo quando ele nem sabe do que ocorre dentro e fora de si, foi isso que Ram fez, foi ao encontro dos pais do garoto e contou-lhes a “sentença de morte”, seu filho tinha indícios de dislexia. “Como assim meu filho é anormal?”. A partir do choque e da freqüente pergunta: “Por que nosso filho?”. É que a aceitação vai sendo delineada aos poucos.
 Segundo a International Dyslexia Association - Comitê de Abril / 1994  apud Mico, (2004) a dislexia:

É um distúrbio de aprendizagem, sendo o mesmo, específico da linguagem, caracterizado pela dificuldade em decodificar palavras simples, mostrando uma insuficiência no processo fonológico.

A criança sozinha não é responsável pelo seu “insucesso” escolar, pois a aprendizagem caracteriza-se por uma relação bilateral, tanto da pessoa que ensina, como da que aprende. (Ercolini, 2008). É preciso saber as causas do não aprendizado do aluno, no entanto, mais do que um diagnóstico o aluno precisa de acolhimento, de afeição. A análise por si só não transforma a realidade, é preciso, segundo Ercolini, usar estratégias para melhorar essa relação de ensino-aprendizagem independente de um diagnóstico de dislexia.
Foi isso que Ram fez, usou estratégias de aprendizado para o garoto e não se prendeu ao que ele não podia, mas potencializou as suas capacidades. O talento de Ishaan era evidente para a pintura e o professor soube usar de forma muito criativa a sua habilidade  propondo um concurso de pintura, isso nos remete à teoria das inteligências múltiplas, na qual a inteligência pode ser expressa de outras formas, que não a convencional. Todo o tempo o professor de artes estava ao seu lado, disponível para adequar o ensino ao garoto, o que falta em muitas de nossas escolas é essa disponibilidade para incluir, para se doar e assumir o compromisso de educar com qualidade independente das dificuldades apresentadas pelo aluno.
O olhar de Ishaan em alguns momentos era de resignação e em outros de revolta, ele não entendia as causas do seu não-aprendizado. Com certeza sentia-se culpado por ser “tão burro”. Não tinha alegria que é própria da infância, tinha apenas um choro contido e uma feição de derrotado. Sua auto-estima estava baixa, pois era vítima de risos, piadas maldosas e castigos constantes. Não tinha forças nem mesmo para se arrumar sozinho, não tinha energia para levantar-se para ir à escola, pois sabia que lá era seu calvário. Somente após entender o que se passava com ele, a partir de uma historinha contada pelo professor em que grandes pensadores de nossa história foram citados como dislexos, é que um sorriso foi visto em seu rostinho de criança e uma certeza em seu coração amargurado: eu posso ter esperanças!
É isso que Gonçalves nos esclarece, ao dizer que somente após saber o real significado do que acontece consigo, é que a criança sente um grande alívio, pois não se vê mais como “culpada” por não aprender. É como se tirasse o mundo das costas. A avaliação (neuropsicológica, psicopedagógica e fonoaudiológica) também é importante e auxiliará no desenvolvimento da criança, na medida em que proporcionará um maior esclarecimento das estratégias a serem usadas com a criança, para que ela possa aprender da forma que lhe é possível.  Igualmente o acompanhamento se faz muito importante para que a criança, não apenas os pais, possam entender e perceber-se como agente do seu aprendizado, ter uma melhor percepção de suas competências,  tendo em vista a melhora na sua auto-estima, bem como saber organizar estratégias de estudo, resolver problemas e enfrentar dificuldades referentes ao aprendizado, isso, através dos mais diferentes recursos. O apoio da família é fundamental, e somente quando os pais de Ishaan souberam aceitar e entender as capacidades diferenciadas de seu filho é que algo novo pôde ser construído, um novo relacionamento familiar baseado na confiança mútua e no amor, que apesar de estar presente em cada um deles, não manifestava-se plenamente pela não compreensão da realidade que os envolvia.

O enfrentamento dessa questão pelo psicólogo, em uma instituição de ensino, está além de seu conhecimento teórico, perpassa antes de tudo pela sua sensibilidade, exige uma empatia para perceber o sofrimento do outro, uma escuta apurada e um olhar diferenciado para enxergar as potencialidades de cada um e não somente suas limitações.
Como citou Gonçalves (2012):

“A pipoca é um milho mirrado, subdesenvolvido que, para alguém que não conheça, parecerá que não pode competir com os grãos normais, graúdos. No entanto, aqueles grãos duros, quebra-dentes, após passarem pelo poder do fogo, transformam-se em pipoca macia”.
                       (Rubem Alves- O amor que acende a Lua)

É um esforço constante para ver o milho tão mirrado transformar-se em pipoca, ver o que não tinha beleza, transformar-se em pipoca macia. Ishaan era esse milho que precisava apenas de alguém que acreditasse que ele podia ser uma pipoca graúda.
O profissional de psicologia, precisa ser esse agente de mudanças, alguém que irá  escutar  os pais, alunos, professores para desenvolver estratégias que realmente se adéqüem as necessidades do estudante,  assim através do apoio incondicional da escola e da família e de outros profissionais ( fonoaudiólogos, psicopedagogos, educadores, médicos, etc) é que se poderá oferecer a esse educando condições para ultrapassar os obstáculos apresentados em seu percurso escolar. É importante também favorecer o autoconhecimento desse aluno, pois somente a partir disso ele aprenderá melhor e poderá ser melhor ajudado.
Em suma, o enfrentamento de tal situação no contexto escolar não pode partir de ações isoladas do psicólogo, mas precisa pautar-se em um conjunto de medidas que partam de diferentes profissionais. E o professor, que acreditou até o fim na capacidade do garoto, pode ser um exemplo a ser seguido, pelo profissional de psicologia, e não só por ele, mas por todos os envolvidos nessa conjuntura. É preciso acreditar no próprio trabalho, acreditar na criança e ajudá-la a acreditar em si mesma e isso não é simples, pois o diferente (nadar contra a correnteza) nem sempre é compreendido, é mais atraente acomodar-se. Muitas vezes as mudanças não são bem-vindas, assim fica fácil engrossar a fila dos que julgam, difícil é juntar-se à ala dos que são julgados.

"Eu sei que não terei sucesso. Tentar forçar os Resultados somente  aumentaria  a  confusão.  Não será melhor desistir e parar de me esforçar? Mas, se eu não me esforçar, quem o fará?"
                                                                                    (Chuang-Tzu )





quarta-feira, 15 de maio de 2013

Abdias





Se pudesse olhar-te de novo,
Minha alma não hesitaria,
Diante de tanta presença,
Tua ausência não se revelaria.

Nos olhos uma seriedade
 Levemente tecida
Ah, como queria,
Tua vida diante da minha.

Teus gestos são simples
Carregados de rituais,
É o chapéu que repousa na mesa
É a alma que descansa em paz.

A dor da perda
Sabes bem o que é
A vida se despediu
Como quem nada quer.

 Tu és apenas um homem
Que não sabe mais sorrir
A dor te enrijeceu
A morte te fez cair.

Ainda te lembro pelos retratos
De cabeceira
Vejo a farda tão bem passada
Lembro da vontade guerreira.

No momento derradeiro  
Não pudeste escutar
A banda em cortejo
Anunciando tua partida.

Talvez só eu não aceite
Porque temos que ir
Você tinha muitas razões
Para desistir.

Acabaram-se as visitas
Já não vias mais a vida
Acabou o sofrimento
   E o escuro da existência.

Sharline Dionízio




sexta-feira, 26 de abril de 2013

O quê da vida





Viver é uma tomada de consciência progressiva. Um dia, muito tempo atrás, as flores eram outras, o brilho do sol queimava menos minha pele, as tempestades pareciam mais desafiadoras, a lua que surgia tão grande no céu realizava todos os meus desejos, a noite tinha um cheiro de sereno proibido, as ruas serviam de palco para aventuras cotidianas e antes que pudesse notar porque as pessoas não acreditavam na vida, ou porque os adultos eram tão preocupados em explicar a vida, eu apenas sentia a vida como fazem os pássaros, como fazem os sábios.
Eu não pensava no que porventura não aconteceu ou no que iria suceder, eu saboreava o momento que surgia despretensioso nas noites e dias que me eram presenteados.
Não sei onde se perdeu esse olhar que só enxergava a simplicidade do mundo.
A vida tão vazia, no melhor sentido do termo, era um nada cheio de sonhos, um não sei repleto de certezas.
E diante das grandezas desse meu caminho eu tinha medo, mas não era angústia, era fraqueza.
Os cenários eram todos novos, recém chegada à vida eu temia os outros e os “eus” que surgiam dos outros.
Quando mirava o céu ele parecia dar ordens, infinito o seu poder sobre mim.
Sinto que tudo que contemplava antes está aqui, mas não pode ser igual,  o rio segue seu curso, o tempo muda as posições, as estações se alternam e o olhar se submete aos limites do espaço e das horas.

Sharline Dionízio

quinta-feira, 4 de abril de 2013

Só escrevo...



A palavra chega como um refúgio.
Ainda que esteja dentro de mim,
 vem como significado externo, 
com o propósito de fazer-me entender
o inteligível.


Os medos, as perdas, os diálogos internos.
 A solidão dos pensamentos tão vãos,
 tão desnecessários.
 Assuntos sem solução, 
vidas que estão à volta e não sabemos quem são.

A  consciência tenta usar a razão, 
mas o outro que nos infere suas idéias nos ganha
 como um conselheiro que nos atormenta,
 e ele quase tem razão.

Não sei se palavras resolvem, talvez não!
 O que faço então com os sorrisos não dados? 
Com a demora?  
Com a distância entre o que mostro e o que sou?  
Entre os olhos que dizem e os olhos que calam?
 Entre os dedos que cruzam e a torcida infundada ?

 O que faço com o grito guardado? 
Com a lágrima que cai? 
Com o choro que não sai?

O que faço com a preocupação inútil? 
Com os insultos?
O que faço comigo quando não mais acredito?

O que faço com a fé? 
O que faço com você? 
O que faço no mundo sem você?

 O que faço com o pensar?
 O que faço com o fazer?
 O que faço com o que não faço?
 Faço e não sei fazer.
.
Penso sem fazer, faço sem pensar! 
 Sou mais que penso e menos o que sou. 


Sharline Dionízio

quarta-feira, 27 de março de 2013

Entrelinhas




           No olhar, na fala, nos encontros que se dão entre intervalos inconstantes, na brisa das palavras que nos impulsiona para recantos escondidos da alma, nos dizeres poucos, nos muitos, na história que poderia mesmo ser nossa, sem, contudo nos pertencer, na fragilidade dos gestos, da forma que nos dirige sua voz, como carrega nos ombros o sofrimento.
          A fala mansa que nos chega como grito de socorro e mesmo que estejamos dispostos a ouvir, há um abismo no entendimento das suas melancolias. Quem pode desvelar o que a alma não deixa encontrar? Onde suas reminiscências esbarram em minhas lembranças, tão iguais e tão sozinhas?
         Como os meus olhos podem descobrir nos seus um pouco de esperança? Os modos, tão cotidianos, tão simples, tão singelos, dizem sem dizer, e, no entanto sinto a intensidade de suas desilusões nas palavras não ditas.  No fundo de cada existência, há uma fonte impetuosa que jorra no infinito de cada um. Sem saber a vida corre, como um rio que não sabe por que vai, é assim que caminhamos sem destino e sem reservas em busca de tudo que desconhecemos.  
          Não sei ao certo da história que há por trás de suas lágrimas, me deixas conhecer somente o que minha capacidade de comiseração pode compreender de um estranho, entretanto em mim há também um choro de incapacidade.

Sharline Dionízio


quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Razões...


Hoje quero falar...

Da saudade que aperta.
Das despedidas que causam agonia.
Quero falar do que as palavras não dão conta.
Do que os seus olhos me inspiram.
Do que a boca cala.
Do que o sorriso delata.
Quero falar em poesia
O que não falo só por falar.
Da vontade de dizer: fica
Quando digo: vá.
Do coração que dispara somente por você chegar.
Da enorme vontade de não me separar.
Dos momentos ao seu lado que excluem todos à volta.
Dos beijos sem comparação e abraços sem explicação
Dos pensamentos constantes, das mensagens reconfortantes
Dos telefonemas de surpresa que fazem a alma pular.
Quero falar da palavra “para sempre” que não ousava citar.
Da metalinguagem dos nossos momentos.
Das crises de riso que me fazem chorar.
Quero falar...
Das mãos dadas, dos dedos dados, dos passos acertados.
Da chuva de beijos por nada.
De todas as formas lindas que me trata.
Da simplicidade dos nossos encontros
E de como valem a pena.
Da lua que nos embala.
Das lágrimas nunca de tristeza.
Dos sorrisos sempre de prazer.
Falar do bem que me faz.
E isso basta para nunca te esquecer!

Sharline Dionízio



quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Siso *´¨)* ¸.•*¸.•*´¨).•


     Mesmo que a sensatez seja o que de melhor cultivo, há momentos em que ela me foge como um pássaro preso há anos que se vê novamente solto. Ser sensato significa ter juízo, equilíbrio, prudência. É isto que procuro: um equilíbrio entre as emoções e a razão. Esta, chega a  roubar-nos os sentimentos, tão bem escondidos, por motivos não tão claros.
    Minha sensatez confunde-se com medo, isto é, covardia, fraqueza, pavor. Será que dizer-me: és sensata! Causa-me orgulho de ser quem sou?
    Por vezes os sentimentos nos tiram a noção de nossos limites, dos limites do outro. Agimos fora do controle e só depois nos damos conta de algum erro.
    O que mais nos torna insensatos: a vaidade, o orgulho, o medo, a ganância, a paixão, entre outros desvarios da vida humana.



  Sharline Dionízio

     

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

O carteiro


Um sorriso foi o que me encantou.
Sorriso largo de quem não precisa ser simpático e foi o que me fascinou.
A mágica de um gesto, o qual  não havia utilidade, mas era tudo que ele podia ofertar.
Da não necessidade nasce o prazer de contemplar, de apreciar.
Sorrir é natural. Todo mundo faz!
Mas aquele sorrir tinha algo mais.
Acabara de se cortar, o sol estava ainda quente e as várias cartas em suas mãos,
denunciavam muito trabalho que ainda iria enfrentar.
Olhei seu sorriso e não pude deixar de reparar na gentileza de seus modos
E na forma que gastava suas horas.
Ainda tinha muitas cartas para levar aos seus destinos, mas ele não tinha pressa.
De apressada, somente eu, que apesar de não ter o que fazer, corria nas palavras,
Nos passos e ele apenas a me fitar.
Limpava seu braço do ferimento e perguntava meu nome com um sorriso cheio
de paciência.
Pensei que sua vida era muito doce, não por ser fácil, mas por conseguir
Sorrir de forma tão verdadeira, quando podia agir com indiferença.
A poesia está em seu olhar, está na lembrança desse sorriso, da lição que recebi
sem que proferisse palavra.
Sorriso que não sei explicar.
Não sei ao certo o que me provocou, mas certamente nunca deixarei
de sorrir mesmo que não haja motivos para tal.
Foi isso que ele me ensinou.

Sharline Dionízio